Coragem de Ser Vulnerável

LEADedu
6 min readMar 13, 2019

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Imagine a seguinte situação:

Você está segurando entre os dedos uma caneta. Ao abrir a mão, a caneta cai no chão. Alguém então pergunta: “por que isso aconteceu?”. Diante do questionamento, podem surgir respostas como: “devido à força da gravidade” ou “porque ela foi solta”. Podem haver outras respostas, mas entre elas, ambas são verdadeiras. A diferença é que na primeira estamos colocando a responsabilidade para fora de nós, enquanto que na segunda estamos assumindo a responsabilidade. Sendo assim, podemos dizer a primeira resposta se trata de uma explicação tranquilizadora. As explicações ou desculpas tranquilizadoras nada resolvem. O problema continuará existindo e provavelmente os resultados serão os mesmos. Elas são tranquilizadoras porque, com elas, nos declaramos inocentes, colocando a responsabilidade em algum fator externo como gravidade, tempo, cultura, etc, e não assumindo controle de uma resposta diferente. São explicações que nos colocam no papel de vítima, onde corremos o risco de sermos percebidos como impotentes ou incompetentes, tirando a possibilidade de uma ação efetiva.

A consultora Carolyn Taylor gera relevância para isso ao afirmar que ao assumirem uma posição de vítima, as pessoas concentram sua atenção e esforços em elementos que estão fora do seu controle com culpas e ressentimentos. Brené Brown, doutora em Ciências Social e autora do bestseller “A coragem de ser imperfeito”, afirma que culpar é simplesmente descarregar a raiva ou um desconforto interno. O inverso disso é a autorresponsabilização, que, por sua vez, significa empreender um processo vulnerável, admitindo frente aos outros algo ruim que possa ter acontecido.

Culpa e ressentimento são geralmente os principais motivos pelos quais perdemos a oportunidade de nos relacionar, ser empáticos e criar conexões com as pessoas. Isto porque, quando nos colocamos frente ao mundo com essa postura e alguém nos relata uma situação negativa não criamos um lugar de verdadeira escuta e empatia: ao contrário, estamos preocupados em buscar os culpados.

Segundo Brené Brown, conexão explica o porquê de estarmos onde estamos, é o que dá propósito e significado a tudo que vivemos. O cérebro humano é uma rede de conexões que nos impulsionam a determinadas ações. É por isso, que o ser humano anseia por fazer conexões com outras pessoas: desta forma, funcionamos melhor. Ela também postula que a vulnerabilidade é ingrediente essencial para que haja conexão e isso se aplica ao ambiente organizacional.

As Conexões nas Organizações

Um estudo realizado em Harvard que durou mais de 75 anos, acompanhou aproximadamente 720 pessoas desde a sua adolescência até a velhice. O objetivo científico por trás de tão extenso estudo, era gerar conclusões acerca do real segredo da felicidade. Segundo o psiquiatra Robert Waldinger, diretor da pesquisa, a principal conclusão do estudo foi que a chave para ser feliz e saudável estava na qualidade das relações estabelecidas ao longo da experiência de vida. Em complemento a essa descoberta, o pesquisador Tsedel Neeley, também de Harvard, concluiu em um de seus estudos que um bom trabalho em equipe está diretamente relacionado com o grau de conexão emocional entre os membros do time.

Dessa forma, sendo as relações uma das necessidades básicas do ser humano e as interações um “meio” para o alcance dos objetivos empresariais, a conectividade surge como habilidade necessária para que a complexidade (do mundo, dos negócios, das operações e das pessoas) e seja entendida e incluída ao nosso dia a dia de forma a somar e não a dificultar essas relações.

Com a Revolução Digital, nossas experiências de interação com os outros mudaram — nos conectamos e conversamos com pessoas que estão do outro lado do mundo como se estivessem ao nosso lado. Mas e as pessoas que estão realmente do nosso lado? Como está o nosso nível de conexão? Para que serve essa habilidade?

Pesquisadores do curso de administração da Northeastern University confirmaram que equipes com alta performance são formadas por pessoas que estão dispostas a assumir riscos e enfrentar desafios baseados na confiança que depositam um no outro. Ainda, salientam que o trabalho em equipe demanda maior confiança do que trabalho individual por causa do alto grau de interdependência exigido para o cumprimento da tarefa. Assim, a confiança fomenta a colaboração e esta, a criatividade e performance.

O que é confiança?

Confiança é a intenção de aceitar a vulnerabilidade com base em expectativas positivas em relação ao outro. Ou seja, ela necessita desses dois elementos para existir: alguém que confia, aceitando a vulnerabilidade, bem como alguém que transmite confiança por meio do seu discurso, ações, imagem.

Jeff Bezos transformou a Amazon de uma pequena loja de livros em uma gigante do e-commerce tomando decisões “com o coração”. Em discurso no Economic Club of Washington, o próprio traz: “Todas as minhas melhores decisões de negócio, e até mesmo na vida, foram feitas com coração, intuição e coragem. Se você pode tomar uma decisão com bastante análise, você deve tomá-la. Mas acontece que, na vida, suas decisões mais importantes serão sempre tomadas com instinto, intuição, bom gosto e, principalmente, coração”.

Esse postulado, de que confiança é essencial para os negócios, foi comprovado por Paul Zak. Ele descobriu que a ocitocina, também conhecida como a molécula da confiança, é fundamental ao progresso e sucesso organizacional.

Em contrapartida, para entender como você transmite confiança aos outros, é necessário compreender como as pessoas decidem confiar em você. Assim como as decisões de Jeff Bezos, baseadas num misto de razão e coração, fundamenta-se a confiança. A decisão de confiar reflete duas dimensões: afetiva e cognitiva, visto que somos seres sociais e racionais.

Confiança afetiva é a confiança que alguém deposita num colega de equipe com base em sentimentos de cuidado e preocupação demonstrados por esse colega. A confiança cognitiva é baseada na disposição de alguém em contar com a experiência e confiabilidade de um membro da equipe.

Ou seja, a confiança envolve a decisão de se responsabilizar por algo e, consequentemente, aceitar a vulnerabilidade, bem como confiar no outro com base nos sentimentos e pensamentos que esse outro suscita.

Como desenvolver confiança?

Em aspectos práticos promove-se confiança com os “3 Cs”:

1 — Coragem: Para enfrentar a vulnerabilidade e se permitir confiar.

2 — Comunicação:

- Clara: Expressar-se de forma clara e frequente para que a equipe esteja alinhada com o mesmo propósito;

- Bilateral: Expor seus sentimentos e ideias, mas também ouvindo os sentimentos e ideias dos outros;

- Humildade: Humildade traz humanidade e humanidade constrói confiança.

- Empática: Mostrar que realmente se importa com o outro. Reconhecer o trabalho do colega. Acordando com a equipe prazos e metas que se encaixam nas expectativas e condições da maioria.

Paul Zak descobriu um jeito simples de aumentar a confiança que o outro tem por você: realizando o movimento contrário, de demonstrar que você confia neles. Isso aumenta a ocitocina, hormônio da confiança nos seus corpos e eles confiam mais em você.

3 — Consistência: Seja um exemplo para seus colegas. Reproduza a máxima da confiança: “faça o que digo E o que faço”.

Portanto, em um ambiente de confiança organizacional os membros da equipe expõem suas ideias e sentimentos, usam um ao outro como fonte, aprendem com o outro e servem de exemplo.

Por que confiar no outro?

A particularidades e idiossincrasias do ser humano são formadas pela soma de todas as experiências pelas quais essa pessoa passou, sua história, suas escolhas e aptidões. Isso permite infinitas possibilidades para soluções de problemas. Imagine uma pessoa da área da engenharia, que seja musicista e professor(a) nas horas vagas, contador(a) de histórias aos finais de semana e que, diariamente, responde a diferentes papéis, como pai/mãe, marido/esposa, filho(a). Tendo acesso a esse universo de informações, essa pessoa poderia ser convidada para atuar em quantos projetos e em quais áreas? E se ela trabalhar em parceria com outras pessoas que também carregam experiências, escolhas e aptidões distintas, qual seria o resultado da união desses variados conhecimentos e papéis? Os resultados são exponenciais.

A conectividade das singularidades humanas promove as alterações que necessitamos para atuarmos plenamente em termos de inovação de processos, produtos e serviços. É através dessas conexões que estimulamos a criatividade, a inovação e a transformação. É pelo compartilhamento de conhecimentos diversos voltados para um objetivo coletivo que pode se dar a solução de um problema ou a criação de um novo projeto.

Precisamos (re)conhecer a pessoa real por trás dos profissionais com quem convivemos: conhecer suas habilidades técnicas, mas também sua potência comportamental, seus talentos e também suas interferências e vulnerabilidades. Conhecer, em suma, aquilo que nos faz humanos.

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REFERÊNCIAS:

Paul Zak (Trust Factor: The Science of Creating High Performance Companies)

Robert Waldinger (Harvard University)

Tsedel Neeley (Harvard University)

Carolyn Taylor (Walking the Talk)

Brené Brown (Houston University)

Portal Startse

Artigo — A Multi-Dimensional Study of Trust in Organizations (Pittsburg State University)

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